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País Rico com Povo Pobre: o verdadeiro desequilíbrio

O Brasil é um país de dimensão continental habitado por 200 milhões de pessoas. Atualmente, possui a 7ª maior economia do mundo com um PIB de quase R$ 5 trilhões. Possui recursos naturais abundantes. Diferencia-se das outras maiores economias por manter preservada grande extensão de seu território, com rica biodiversidade.

Além da riqueza econômica e da biodiversidade, o Brasil possui uma valiosa diversidade cultural. O povo brasileiro foi formado por diferentes matrizes étnicas, o que repercutiu nos costumes, tradições, artes, práticas religiosas, entre outras manifestações. O país é um belo mosaico que, apesar da grande diversidade cultural, não vive em conflito de ordem religiosa ou cultural que coloque em xeque a integração do território nacional.

Apesar da riqueza que tem origem na espiritualidade e diversidade de costumes, o povo brasileiro é materialmente pobre. A renda média da população é baixa. A participação dos salários na composição da renda agregada é de, aproximadamente, 50%. Os empregos gerados são, de maneira geral, de baixa produtividade. Há, ainda, um grande número de trabalhadores ocupados em vagas informais (50%) e mesmo nas vagas formais, não raro, os trabalhadores estão submetidos à condições precárias de trabalho.

Então, o Brasil é um país com enorme desigualdade social. Um dos países de maior economia, mas com um povo materialmente pobre. É também um país de grandes disparidades econômicas regionais. Essas disparidades entre as regiões precisam ser superadas a fim de que o país possa desenvolver-se plenamente.

A desigualdade entre as regiões e classes sociais no Brasil é resultado de um processo histórico que preservou a hegemonia do poder de elites locais na política regional e nacional. Este poder é reflexo da forma como foram organizados os sistemas produtivos (tipo de empreendimento e relações de trabalho) de cada época, em cada região. Dito de outra forma, faz parte da formação econômica do país.

No início do século atual houve mudanças importantes na orientação da política brasileira, com o aprofundamento de práticas democráticas. O avanço nesse sentido é resultado de um processo de mobilização, organização e luta dos trabalhadores. Apesar de, do ponto de vista da política econômica, serem mantidas as diretrizes que orientaram a mesma no final do século passado (câmbio valorizado, altas taxas de juros e compromisso em gerar excedentes para pagamento dos serviços da dívida), foi priorizado o emprego e tem havido um esforço na diminuição das desigualdades sociais e regionais.

Atualmente, a economia brasileira está com a menor taxa de desemprego da história, com importante crescimento nas vagas formais de emprego, e a desigualdade social, apesar de ser ainda enorme, tem diminuído. A participação dos salários no produto tem crescido e a desigualdade entre estes rendimentos (do trabalho), medida pelo Índice de Gini, está próxima da que tínhamos no início dos anos 1960, quando este indicador alcançou o melhor nível (menor desigualdade).

Apesar dos avanços recentes existem inúmeros desafios. A impossibilidade de ter avançado em reformas estruturais num estágio de desenvolvimento capitalista caracterizado pela radicalização da globalização e pelo poder do capital transnacional, fez com que nossa economia, neste início de século, continue numa situação de dependência, principalmente pela fragilidade da indústria nacional num ambiente mais competitivo. Esta dependência está relacionada a necessidade de constante crescimento das exportações (ou preços) de commodities e dos altos juros, como forma de manter o equilíbrio das contas externas no curto prazo.

Diante deste gargalo, o esforço da política econômica no sentido de gerar emprego e valorizar salários, dinamizando o mercado interno, tem impactado mais diretamente e positivamente o setor de comércio e serviços. Ou seja, as dificuldades das empresas não estão nas vendas, mas na produção. Parece que o impulso originado pelo crescimento da demanda (mais empregos e valorização dos salários), não serviu como estímulo aos industriais para investimentos em progresso técnico. Assim, esses criticam tais políticas “equivocadas” do governo.

Alguns setores industriais intensivos em mão de obra, que foram beneficiados com desoneração de folha de pagamentos para manterem empregos, passam a reclamar da queda da produtividade e encontram uma saída de curto prazo, ampliando a participação de produtos importados nos seus respectivos faturamentos, que crescem na medida em que amplia-se a demanda interna. Ou seja, diante da perda de competitividade, indústrias de bens de consumo estão metamorfoseando-se em atacadistas e mesmo varejistas.

Nessa dinâmica, com uma queda mais forte das exportações ou dos preços dos produtos exportados a conta corrente começaria a demonstrar maior desequilíbrio. Com isso, há maior resistência para que a taxa de juros permaneça em patamar elevado. A pronunciada elevação da taxa de juros nos EUA amplificam uma crise de expectativas e emperram os investimentos produtivos de longo prazo (indústria de bens de capital e de construção) no Brasil. As incertezas inerentes a um ano eleitoral também travam novos investimentos.

Nesta combinação de menor crescimento econômico e pressões sobre as receitas, o Estado perde a capacidade de realizar investimentos em infraestrutura, o que é fundamental para a continuidade do desenvolvimento econômico no Brasil, por ampliar a competitividade e produtividade da indústria. Assim, ampliam-se as concessões de obras de infraestrutura para o setor privado, que têm demonstrado ser, de um modo geral, bastante exigente, tanto no que diz respeito às taxas de retorno sobre os investimentos, quanto à flexibilização de exigências/contrapartidas impostas por parte do governo.

Mas o Brasil tem um potencial enorme de crescimento. No mercado interno a demanda é reprimida para certos bens e serviços, pois o consumo está orientado para produtos de menor valor agregado, diante da renda média baixa das famílias. Pelo lado da oferta, as descobertas recentes de campos de petróleo devem tornar o país um dos maiores produtores, com a Petrobras tornando-se uma das cinco maiores petroleiras do mundo. Estas descobertas “prometem” alavancar os investimentos e dar novo fôlego para o avanço da indústria brasileira, com ganhos de competitividade. Leis recentemente aprovadas pelo Congresso devem garantir o direcionamento de parte dos ganhos com a exploração do petróleo para a saúde e a educação, ampliando os investimentos e renda gerada com estes serviços, além de melhorar o atendimento à população.

O momento de baixo desemprego e valorização dos salários testa a organização dos trabalhadores para avançar nas conquistas econômicas e sociais. Neste momento existem pressões enormes de grupos sociais para flexibilizar direitos, precarizar o emprego da força de trabalho e reduzir o ritmo de valorização dos salários. Os discursos sobre a necessidade de “ajustes” na política econômica sinalizam para um desaquecimento forçado do mercado de trabalho. São propostas contra o desenvolvimento social, discursos alinhados à interesses de grupos que sempre concentraram em sua posse o excedente social gerado em nossa economia,  sem maiores benefícios para a sociedade brasileira.

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(¹) Mairon E. Brandes, economista, técnico do Dieese na Subseção da Fetiesc.

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