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Passaporte para nosso futuro

Mairon E. Brandes¹

A produção industrial brasileira registrou queda de 3,2% em 2014. Quando detalhamos este número para a indústria de transformação e extrativa, percebemos que aquela teve queda de 4,3% na produção, enquanto esta registrou crescimento de 5,7%.

Mesmo com a contínua queda do preço de algumas commodities, como o minério de ferro, gás e petróleo, a atividade de extração seguiu apresentando crescimento no ano passado. Em cinco estados (Goiás, Mato Grosso, Pará, Pernambuco e Espírito Santo), estas atividades e também às de produção industrial relacionadas à agropecuária, fizeram com que a produção da indústria geral fosse positiva, dado o peso que estes setores têm na estrutura produtiva destes estados.

Este contraste na dinâmica produtiva entre indústria de transformação e extrativa no Brasil expõe um desafio que a economia e a sociedade brasileira precisa enfrentar a fim de avançar no caminho de um modelo de desenvolvimento sustentável do ponto de vista econômico, mas também ecológico e social. Uma questão central neste sentido é o uso racional, sob a ótica do desenvolvimento, dos recursos naturais que o país dispõe e das vantagens comparativas subsequentes desta disponibilidade.

Dito de outra forma, os custos de exploração destes recursos fazem sentido numa estratégia que tem no horizonte a diminuição ou total eliminação da dependência da exploração destes recursos naturais como forma de manutenção de algum grau de investimentos e equilíbrio das contas externas da nossa economia. Ou seja, sua exploração precisa ser encarada não como um fim econômico, mas um meio capaz de tornar a indústria local competitiva e a sociedade desenvolvida. Para alcançar desenvolvimento sustentável, o Brasil precisa se livrar da dependência destas atividades econômicas, porque demandam um sistema produtivo fundamentado em propriedades de grande extensão territorial, com graves impactos ecológicos e sociais.

Por isso é importante que estes recursos naturalmente localizados em território brasileiro permaneçam sob propriedade e controle da sociedade brasileira. Esta questão é particularmente importante no atual momento da economia e política brasileira. O início da exploração dos campos de petróleo do Pré-Sal, exclusivamente pela Petrobrás, conforme previsto pelo regime de partilha adotado no leilão de Libra, por exemplo, sinaliza todo o potencial que o uso deste recurso estratégico tem para o desenvolvimento do país. Trata-se, de fato, do “passaporte para nosso futuro”. 

Pela importância que o Brasil tem na geopolítica da América Latina, este poder se amplifica e não à toa, atrai ameaças à soberania nacional, vide ocorrências de espionagem da Agência Nacional de Segurança dos Estados Unidos (NSA) em 2012, que causou certo stress diplomático entre Brasil e EUA, com a presidenta Dilma cancelando a visita que faria a este país.

Existem outros tipos de ameaças e acontecimentos pelos quais a Petrobrás e o Brasil sofrem e precisam superar. As investigações da Operação Lava-Jato cujo objeto é a corrupção nos contratos estabelecidos entre funcionários representantes da estatal com as principais empreiteiras de construção pesada do país, testam a capacidade das instituições no Brasil de julgarem o caso.

Está claro que, pela forma como as notícias da investigação são publicadas, a opinião pública se voltou contra o governo e a imagem da Petrobrás está sendo deteriorada. Não são poucos os especialistas que defendem, nos meios de comunicação de massa, a privatização da estatal. Há, portanto, interesses poderosos por trás destes acontecimentos.

Além de afetar as expectativas, a investigação tende a impactar os processos operacionais da Petrobrás e das empreiteiras envolvidas. Ou seja, já houve o rebaixamento das notas de avaliação de risco destas companhias, o que tende a impactar os investimentos com consequências na produção das mesmas. Assim, o resultado de estagnação do nível de atividade econômica no Brasil em 2014, tende a transformar-se em recessão neste ano, dada a queda dos investimentos (FBCF). As empreiteiras envolvidas são as mesmas que participam de grandes obras de infraestrutura no país, como usinas hidrelétricas, rodovias, aeroportos, entre outros.

Estamos vivendo uma conjuntura bastante complexa neste início de século no Brasil. A industrialização no país não tem bem cem anos de história. As conquistas resultante das lutas dos trabalhadores não foram poucas neste período, ainda que insuficientes para transformar a realidade histórica e social do país. A democracia que temos tem aproximadamente trinta anos ininterruptos de história, apenas. A vida dos trabalhadores, mesmo com as melhorias que teve, sobretudo, devido a política de valorização do salário mínimo nestes quinze anos de século XXI, é ainda duríssima. Existem muitos direitos a serem defendidos e ampliados no presente, para o bem-estar das gerações futuras. 

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¹ Economista, técnico do Dieese na Subseção da Fetiesc

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