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Opinião – “E precisamos todos, todos, rejuvenescer”

Este ano de 2016 tem sido um ano pesado no Brasil. Ele deve ficar marcado na história, como síntese, pelo impedimento da presidente eleita, Dilma Rousseff. Mas a complexidade da crise e as incertezas instaladas no país e no mundo, oferece um prato cheio para qualquer pessoa que procure compreendê-la.

Um dos aspectos importantes da análise é a revelação do conflito de classes, depois de um período de, aproximadamente, 10 anos de relativa paz política, onde o crescimento econômico permitiu a adoção de um modelo político que atendesse os interesses de diferentes estratos econômicos e sociais da população. Cabe destacar que a classe média, sobretudo pela caracterização de renda média e meia idade, esteve numa condição de menor favorecimento na movimentação percebida na pirâmide social.

De um modo geral, pode-se constatar, inclusive através de pesquisas, que nas manifestações populares, seja de rua (pelo impeachment, por exemplo), seja de urnas (eleições municipais), houve um forte desejo de mudança e, sobretudo, de negação do sistema político, com algumas exceções. Emergiram com maior ou menor força reivindicações pela volta do regime militar e foram eleitos governantes com perfil empresarial, com discurso pouco afinado com o “politicamente correto”, com um discurso diferente, sem falar no número expressivo de votos nulos. O gosto por este tipo de discurso e este desejo de mudança partiu, fundamentalmente, de adultos. Cabe destacar que este tipo de comportamento não se restringe a realidade  brasileira.

Por outro lado, mesmo em reação a esta vontade e comportamento mais conservador de diversos povos pelo mundo, emergiram manifestações de jovens que procuram resistir às mudanças em curso. Estes atos de resistência foram mais ou menos observados no Reino Unido após a vitória do “Brexit” e nos EUA após a eleição de Trump, como exemplos, ambos movimentos que refletem posições patriotas ou mesmo nacionalistas de direita. No Brasil, a juventude representa o principal grupo social de resistência ao governo de Michel Temer ao ser o estrato social que tem organizado, mobilizado e manifestado maior indignação pela medidas anunciadas. Cabe destacar que no governo Dilma, em 2013, a juventude brasileira havia ido para as ruas com muita força também.

Antes do impeachment, secundaristas já haviam ocupado escolas no Estado de São Paulo e forçado o governo estadual a recuar na medida que propunha reestruturar/diminuir o número de escolas. Depois, no mesmo Estado, surgiram escândalos de corrupção envolvendo a compra de merendas escolares, o que fez com que os jovens ocupassem a Assembleia Legislativa do Estado, forçando a abertura de uma CPI para apurar o caso. Depois do impeachment e do governo ter tomado como uma das primeiras medidas a reestruturação das pastas ministeriais e a Cultura perder tal status, diversos equipamentos públicos da área foram ocupados,  orçando também o governo recuar. Atualmente, por quase todo o país, mais notadamente, no Estado do Paraná, secundaristas ocupam escolas para demonstrar aos governos federal e estadual que querem ser ouvidos sobre as mudanças que o governo pretendeu, através de decreto, promover na matriz curricular do ensino médio.

Enfim, a juventude demonstra mais uma vez que, em tempos de fortalecimento das ideias conservadoras e de ideologias que enaltecem o individualismo, o autoritarismo, a discriminação, o preconceito, o ódio e vários outros valores que tendem a nos fazer retroceder enquanto sociedade, ela assume o protagonismo pela luta/resistência. Evidentemente, a juventude não consiste numa massa social e cultural homogênea, outros jovens emergem enquanto organizações para minar a ação dos que lutam contra a perda de direitos, eles acabam reproduzindo explicitamente ideias preconceituosas e violentas.

No Brasil, a organização que conquistou maior visibilidade neste sentido foi o Movimento Brasil Livre (MBL) que cresceu nos atos pelo impeachment de Dilma Rousseff, ganhou espaço no Congresso e na sociedade, favorecidos pela imprensa. Jovens deste movimento atuam para a “desocupação” das escolas, infiltrando secundaristas, entre outras ações de apoio aos governos de direita. Como se sabe, as redes sociais tornaram-se um importante espaço de debate e instrumento para as mobilizações, o que reflete na própria forma de organização destes grupos, mais horizontalizadas.

Existe ainda uma grande massa de jovens que recebe e reproduz mensagens nas redes sociais, mas vive alienada do que se passa no Brasil, sem formar consciência de como as mudanças em curso podem afetar a vida em sociedade. Estes passam a ser “disputados” por grupos à esquerda e à direita. A realidade de trabalho precário, com jornadas longas e exaustivas, parece ser um dos principais motivos que acabam por afastar o jovem das discussões dos grandes temas nacionais.

Publicação recente do Dieese informa que em 2014 haviam pouco mais que 52 milhões de jovens no Brasil (quase 25% dos residentes). Destes, 62,8% são economicamente ativos (participam do mercado de trabalho). Apenas metade destes jovens estão empregados (ocupação formal) e a taxa de desocupação é de 13,6%. Um dado muito interessante é que da população jovem (de 14 a 29 anos), 47,1% apenas trabalhavam e só 15,7% conciliavam estudo e trabalho. Para a organização dos trabalhadores, fazer com que o jovem participe mais do sindicato e das atividades sindicais tem se transformado num imenso desafio. O sindicalismo envelheceu, assim como envelhece a população brasileira. As relações de trabalho também estão passando por transformações, com tendência para o crescimento do trabalho “autônomo-supervisionado” (contratos flexíveis de emprego).

No início deste mês de novembro, a Fetiesc promoveu, como fez nos últimos 9 anos, mais um Encontro Estadual da Juventude Trabalhadora. Participaram de dois dias de atividade de formação e integração, aproximadamente, 200 jovens. Uma pesquisa com os participantes apontou que 86,1% deles eram associados ao sindicato, mas numa aparente contradição, apenas 37,7% afirmaram participar do sindicato. Ou seja, o sindicato parece algo distante. Quando perguntados sobre “o que falta para que o jovem participe mais do sindicato”, dentre várias respostas, 19,2% indicaram a falta de informação/conhecimento sobre o sindicato (questão mais mencionada). Cabe informar que, dentre os problemas que mais preocupam o jovem, o desemprego foi o mais citado.

O jovem está sempre relacionado à esperança nos discursos políticos. O papel historicamente desenvolvido pelo sindicalismo no processo civilizatório está em risco e altamente ameaçado, seja pelas forças opositoras, seja pelas próprias fraquezas do sindicalismo. Reverter esse jogo, principalmente depois de um longo período de letargia, não será tarefa fácil. Parece que o sindicalismo precisa da juventude e “precisamos todos, todos, rejuvenescer”.

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Mairon E. Brandes, economista.

Imprensa Fetiesc

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