A 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou, nesta quarta (19), o frigorífico Seara, hoje integrante do grupo JBS, em R$ 10 milhões por danos morais coletivos em razão do descumprimento de medidas de proteção à saúde dos trabalhadores na unidade de Forquilhinha, em Santa Catarina.
Além da indenização, a empresa também deverá proceder com uma adequação das condições de trabalho, concedendo pausas de recuperação térmica, não exigir horas extras em ambientes frios, emitir comunicações de acidentes de trabalho em caso de doenças ocupacionais, conceder tratamento médico integral a todos os empregados com doenças ocupacionais, aceitar atestados médicos de profissionais não vinculados à empresa e reconhecer o frio como agente insalubre, entre outros.
A JBS afirmou, em nota, que aguardará a publicação do acórdão para avaliar se entrará ou não com recurso para reverter a decisão do TST. E que a ação civil teve início em 2007, período em que a Seara Alimentos ainda não estava sob a gestão do grupo – o que veio a ocorrer, efetivamente, apenas em outubro de 2013.
“Desde quando passou para a gestão da JBS, todas as unidades da Seara Alimentos receberam investimentos significativos, tendo sido implementada uma série de melhorias. Procedimentos de segurança foram adotados e todas as melhores práticas de gestão adotadas nas unidades da JBS foram também implantadas nas fábricas da Seara Alimentos”, informa a nota. “A JBS tem melhorado sistematicamente seus procedimentos de segurança de trabalho, com o objetivo de garantir a seus colaboradores um ambiente saudável para o desempenho de suas atividades.”
A decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região, que já havia condenado a empresa a pagar indenização por danos morais coletivos, cita uma “legião de trabalhadores afastados”, parte deles em “situação irreversível de incapacidade laboral, não tendo a empresa implementado qualquer medida preventiva a mudar este quadro”.
Segundo o TRT, “restou sobejamente comprovada nos autos a conduta reprovável da ré que, ao longo de muitos anos, precariza o meio ambiente de trabalho e omite-se em adotar as normas de proteção à saúde dos trabalhadores, obtendo considerável vantagem financeira em decorrência de suas condutas, que poderiam até mesmo dar ensejo ao denominado dumping social”.
De acordo com o Ministério Público do Trabalho, a ação (ACP 0183900-16-2007-5-12-0055) teve início quando trabalhadoras do frigorífico, não mais suportando o frio, buscaram se aquecer fora do posto de trabalho. A empresa teria demitido esse grupo por justa causa. A situação foi denunciada ao MPT que com o apoio do sindicato, iniciou uma investigação.
Na ação movida pelo MPT, constam os seguintes depoimentos de trabalhadores:
“…eles deveriam melhorar a temperatura, que está frio demais. Não é fácil para aguentar na sala de corte…”
“…aqui é frigorífico, mais nós não somos pinguins, pode botar três meias, mais o pé continua congelado e as mãos estão ficam dormente que não sente os dedos”
“…está muito frio, está um inferno…”
“Temos que reduzir o ritmo de trabalho, por que nós não somos robô, somos seres humanos.”
“…estou abaixo de remédio, já estou dopada de tanto tomar remédio para a dor, me ajudem”
“Estamos sendo torturados dentro da empresa….”
“…se você se sentir mal vai na enfermaria não tem médico tem que trabalhar doente, atestado de outro médico não aceita, é uma vergonha, se morrer trabalhando eles vão dizer que é psicológico também, só para não pagar os direitos para família.”
Inicialmente, a sentença da 4ª Vara do Trabalho de Criciúma condenou a empresa a indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 14,6 milhões, valor aumentado pelo TRT da 12ª Região (Santa Catarina) para R$ 25 milhões. O Tribunal Superior do Trabalho reduziu a indenização para R$ 10 milhões, mantendo as obrigações sob pena de multa de R$ 100 mil reais por infração.
“A decisão é um precedente importantíssimo do ponto de vista da defesa dos interesses difusos e coletivos, em nome da saúde e segurança dos trabalhadores da agroindústria. E demonstra a preocupação do Poder Judiciário trabalhista com as conhecidas más condições a que estão submetidos os empregados de frigoríficos”, afirma o procurador do trabalho Jean Voltolini, que ajuizou originalmente a ação.
“Apesar de ser uma conquista a decisão, a condenação pelo dano moral coletivo deveria ter sido muito maior no intuito de ter um caráter pedagógico eficaz”, completa Jean.
Para os procuradores do trabalho, Sandro Sardá e Heiler Natali, coordenadores nacionais do projeto do MPT de adequação das condições de trabalho em frigoríficos, a decisão da 3ª Turma do TST mostra que o judiciário trabalhista está atento e coibirá a violação aos direitos fundamentais dos trabalho.
Para Sandro, “apesar da indenização por danos morais coletivos ter sido reduzida, o valor é bastante expressivo e denota a aplicação da teoria dos danos punitivos quando constatados a violação da saúde e dignidade dos trabalhadores”. Ressalta que a empresa foi adquirida pela JBS, maior empresa global no setor de processamento de proteína animal, com mais de 200 mil empregados em todo o mundo e lucro líquido de R$ 1,1 bilhão no terceiro trimestre deste ano.