Ministério da Economia alega que o exame ocupacional causaria aglomerações e exporia trabalhador a risco de covid. Centrais sindicais rechaçam a proposta
Com o duvidoso argumento de proteger trabalhadores de aglomerações durante a pandemia de covid-19, governo de Jair Bolsonaro prepara mais um ataque aos direitos trabalhistas: a desobrigação da realização de exame ocupacional pelas empresas. No último dia 29, o Ministério da Economia publicou a Nota Informativa SEI no 19627/2020/ME, com minuta de portaria que suspende também exames clínicos e complementares relacionados às atividades nos locais de trabalho. O acompanhamento da saúde dos trabalhadores está previsto na Norma Regulamentadora no 07, que obriga a elaboração e implementação, por parte de todos os empregadores e instituições, do Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO). O objetivo é promover e preservar a saúde dos trabalhadores pela cumprimento de parâmetros mínimos e diretrizes gerais das condições de trabalho. Pela proposta do governo, que será apresentada durante a reunião da chamada Comissão Tripartite Paritária Permanente (CTPP), nos dias 13 e 14 deste mês, esses exames seriam realizados no prazo máximo de 180 dias a partir do fim do atual estado de calamidade pública. A regra valeria para exames admissionais e periódicos e excluiria os demissionais.
AFRONTA À SAÚDE – A CUT rechaça a proposta, que considera afronta à saúde e à segurança dos trabalhadores. Por isso, não apoiará a minuta de portaria na comissão tripartite. Para a central, a medida coloca em risco os trabalhadores. “A suspensão da obrigatoriedade da realização de exames fazia parte da Medida Provisória 927/2020, que caducou. Como o governo não pode mandar ao Congresso outra MP de igual conteúdo, tenta agora por meio do Ministério da Economia. Lutamos muito contra a aprovação dessa MP e somos contrários a essa nova proposta”, disse a secretária de Saúde do Trabalhador da CUT Nacional, Madalena Teixeira.
A dirigente destacou a importância do exame ocupacional para a saúde e a segurança dos trabalhadores. “Se o exame deixa de ser feito, doenças adquiridas (pelas condições do trabalho) podem se agravar. Ficaremos atentos e faremos o enfrentaremos contra essa medida, que é um retrocesso”, disse. Ela cita, por exemplo, categorias do setor químico, diante da exposição cotidiana a riscos de várias contaminações.
O presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Adilson Gonçalves de Araújo, reforça que a proposta do governo Bolsonaro representa mais um ataque a direitos da população. “As centrais vão se manifestar de maneira contrária a mais este retrocesso. Além de vetar a indenização para os trabalhadores da saúde vitimados pela covid-19, agora o time do genocida quer desproteger ainda mais os trabalhadores. Bolsonaro é mais que um genocida. É um exterminador de trabalhadores”.
RETROCESSO
O Instituto Trabalho Digno divulgou nota técnica em que alerta para mais este retrocesso na regulamentação de saúde e segurança no trabalho, “ que mesmo alegadamente temporária, revela a natureza perversa do processo”. E ressalta que o artigo 168 da CLT prevê que “será obrigatório exame médico ocupacional, por conta do empregador, nas condições estabelecidas neste artigo e nas instruções complementares a serem expedidas pelo Ministério do Trabalho”.
Os técnicos do instituto lembram que o exame médico admissional é fundamental para avaliar as condições físicas e mentais do trabalhador para exercer a função para a qual está sendo admitido. Sem ele, há o risco de não serem identificadas vulnerabilidades e agravos que poderão expor não apenas os trabalhadores em processo de admissão, mas todos aqueles com quem irão manter contato durante o trabalho.
Além disso, a depender das condições e da organização do trabalho, trabalhadores são expostos a fatores psicossociais e ergonômicos, bem como a agentes físicos, químicos e biológicos, agindo de forma isolada ou sinergicamente. “Uma aposta temerária com a saúde alheia, atingindo milhões de pessoas em trabalho presencial na pandemia e após a vigência do estado de emergência”, alertam.
Eles destacam ainda que centenas de estressores físicos, químicos e biológicos continuam presentes no ambiente de trabalho mesmo na pandemia. Por si só, a condição já é uma anomalia funcional importante, mas há presença constatada de outros fatores de risco para o adoecimento humano. Assim, suspender os exames durante a emergência em saúde pública, mais os 180 dias após declarado seu fim, significa manter trabalhadores expostos. Isso, mesmo sendo eles portadores ou não, estando contaminados ou não. Na medida em que há uma sugestão de omissão avaliativa médica aos mais diversos agentes deletérios à saúde, a proposta vai no sentido contrário da CLT e de cláusulas pétreas da Constituição.
(Redação: Fábio M. Michel – Fonte: Rede Brasil Atual – copilado de Informativo CNTI de 10.08.2020)